Escute lendo o Capitão dos Cafundós. É um som bom, meio espaventado. A dastardly loving concoction of Frank Zappa, John Zorn and Mr Bungle processed through a Burrows-esque descent into musical madness.
Falaram-me da materialização de Deus, presente em vários locais ao mesmo tempo, possível porque presente como conceito, não como corpo e sujeito a ser decomposto em energia e matéria. Um rumor escurecendo o céu e o observador nada consegue distinguir na frieza escura das nuvens. Eis formado o rosto de Deus, evidente à criança que vê dragões e cavalos nas nuvens, porém esta face divina está protegida do escrutínio da humanidade pelo negrume. E ele fala roncando em trovões, numa língua cifrada para eleitos. E pisca os olhões em relampagadas que eriçam pelos de eletro-estática e pipocam clarões de tampar espelhos com lençóis das casas da carpideiras. A beata que eleva aos céus mãozinhas dos dedos nodosos que suplicam – olha só – para o próprio Deus que pare de ser Deus; lágrima do peito aberto, coração de Deus ferido, nos defendei da tempestade e de todos os perigos. Esse ronca-roncar as assustam, a beata e as carpideiras, e soltam uma benzeção desatinada que só elas. Deus que ronca no céu é tupã deus de índio e largar os traques nos céus não vai resolver nada. A confusão sua é a mesma confusão delas ali, rebantendo relâmpago com fé.
Quando eu tinha sete anos de idade, eu andava armado. Pente carregado na espoleta de fumegar cano canela seca Hoje não mais Têm caras que tem todos os dentes e um bom emprego Eu não. Têm caras que quando me vêem, atravessam a rua Vão para o outro lado da calçada To começando a me achar indigno de andar do Mesmo lado que eles De olhar pras suas mulheres esguias De me ver refletido no vidro dos seus carros caros De não Ter nada prá levar nas mãos Nem nos bolsos De não poder usar o mesmo banheiro To pensando e tenho pensado muito Em recuperar os meus revórves — R. K. In:Billy the Kid
Minha primeira lista-das-dez-coisas-para-se-fazer-antes-de-morrer foi escrita há 15 anos. Era uma época em que eu não sabia direito como o mundo funcionava. O tempo passou, não fiz muita coisa lá citada e a ideia não rendeu paçoca de pilão como deveria.
Outrossim resolvi rever alguns dogmas e anátemas complexas que cerceavam todo o ideal adolescente e reciclei todos os paradigmas para assuntos menos babacas (ou o que lembrei e que pudesse ser, de fato, babaca).
Abaixo a versão atualizada 2023, comentada e revista (anteriores compiladas v:2006 / v:2009 / v:2013 / v:2018), que deverá ser reciclada e execrada daqui um tempo. Os itens velhos e idióticos continuarão presentes, como prova de que o passado é um monstro celenterado como uma esponja babenta.
‘Já completei’ aparecem com o ✔︎ troféu do sucesso.
Parcialmente completo
aparece riscadinho.‘Deu certo não’ aparece com o ✘ troféu ‘Soube quando desistir’.
É bom passear os olhos e perceber que alguns desejos eram grandes e que hoje em dia são apenas realizações que estão aos pés de atividades muito mais épicas.
✔︎ Aprender
caligrafia,tipografiaelettering.✔︎ Ler a Bíblia, o Alcorão e a Torá.
✔︎ Entrar em um estabelecimento e dar de cara em um vidro.
✔︎ Cair numa piscina com roupa/mochila e tudo sem ter esse interesse.
✔︎ Quebrar uma parte do corpo.
✔︎ Ficar com fama de quem promete e não cumpre.
✔︎ Ser o otário da frase: “Todo dia sai na rua um otário e um esperto. Se eles se encontram, sai negócio”.
✔︎ Deixar a luz acesa para os vizinhos acharem que tem alguém em casa.
✔︎ Ler um livro mal escrito, auto-ajuda ou idiota.
✔︎ Emagrecer para não morrer (tem que ser uns 50kg pelo menos)
✔︎ Investir £12.50 em criptomoeda
✔︎ Entrar para uma seita.
✔︎ Plantar uma árvore.
✔︎ Pular do topo de uma cachoeira alta. E sobreviver.
✔︎ Pular de uma ponte. E sobreviver.
✔︎ Pular da plataforma de 10m. E sobreviver.
✔︎ Nadar pelado.
✔︎ Voar de balão.
✔︎ Voar de planador.
✔︎ Ir na academia de madrugada na base do ódio (5am morning club).
✔︎ Trabalhar virado sem dormir.
✔︎ Veículo 4x4. Pra poder subir em um gramado que seja impossível para um carro normal.
✔︎ Plantar uma horta.
✔︎ Transformar lazer em profissão e nunca mais descansar.
✔︎ Andar em um tanque de guerra. Para saber como é um treme-terra por dentro.
✔︎ Participar de processo seletivo com dinâmica de grupo imbecil (Bonus: conseguir ser sarcástico mas não ser notado pelos recrutadores).
✔︎ Participar do Movember com um desafio impossível que funcione no final.
✔︎ Fotografar pessoas e escutar histórias por trás de pares de olhos.
✔︎ Morar em outro país. E aprender a cultura local.
✔︎ Comprar uma câmera fotográfica com lente gorda.
✔︎ Ter um relógio de pulso. Bom, cheio de ponteiro e luzinha e botão e barulhinhos.
✔︎ Achar uma praia deserta e acampar nela. E ficar a noite inteira contando estrelas.
✔︎ Casar.
✔︎ Passar um tempo em lugar isolado e desértico, longe de tudo e de todos.
✔︎ Visitar um país novo por ano.
Treinar
fotografia conceituale médio formato.Andar descalço em superfícies diversas.
Musgo,gelo,neve,areia fina, cinza vulcânica nova esal de salar.Compor uma música.E achar um violeiro para musicar os versos que farei.Começar a escrever um livro.E terminar.Pilotar um drone.Aprender a domar essa criatura dos infernos e ser responsável ao ponto de não perdê-lo na floresta de Sherwood.Tocar em animais inéditos: Baleia,
tubarãoe tubarão-baleia.Porco-espinho,tatu,esquiloearminho.Coruja,bicho-preguiça. Tigre, leão da montanha e cheetara. Carcajou, kinkajou e panda vermelho. Pangolim.Passar na frente do Cerro Aconcágua.E subir aquele troço.Deserto do Atacama,Salar de Uyuni, Macchu Picchu, Ushuaia.Voar de dirigível.
Entrar em um submarino nuclear.
Aprender manobras de Queda Livre AFF.
Planejar um carro e participar do Rally Mongol.
Dormir 4 noites no Explora Patagônia.
Conhecer tribo indígena brasileira que sirva macaco sapecado.
Ver o Quarup.
Esculpir ou replicar uma obra do meu avô paterno.
Resgatar estudos e gabaritos de luthieria do meu avô materno e tentar refinar/aprimorar com estudos físicos de som e dinâmica de madeiras.
Passar uma noite na Antartida.
Conhecer um acampamento-base no Himalaia.
Viajar para o Butão. Coréia do Norte. Cuba. Porque é difícil. Porque Fidel tá indo. Porque os americanos vão explodir tudo.
Ter um filho. Deve ser um inferno. Ou o paraíso.
Ter um cachorro grande, burro e inteligente.
Ter um gato que comeria a metade do rosto do dono que morava sozinho caso tenha morrido.
Comprar e restaurar um carro antigo para ter dor de cabeça e despesa.
Ter uma escultura assinada. Gente adulta tem escultura assinada ou pintura catalogada.
Assinar o pacto de uma casa própria.
Ter milhas para vencer que é o resultado de uma equação complexa e profunda de sucesso.
Fazer uma tatuagem.
Cantar bingo clássico para as véia.
Finalizar uma linha eficiente de ilustrações e gravuras e tentar usá-las de uma maneira mais profissional.
Aprender Arduino/Raspberry Pi e criar alguma engenhoca que realmente seja util.
Ser influenciador de LinkedIn.
✘ Plantar um pinhão e tentar fazer um bonsai de Araucária neagari com a copa em forma de taça.
✘ Ter dinheiro e fingir que é pobre só para se enturmar.
✘ Ter uns amigos. Deve ser daora.
✘ Aprender a modelar 3D de forma acadêmica e estruturada, nada de bonecão de argila feito no facão.
✘ Manter uma Impressora 3D funcionando. É uma resposta contemplativa e recompensada do item acima.
✘ Aprender a tocar La Bamba/Stairway to Heaven no violão. Ou qualquer outro tipo de cordas.
Morrer.
Essa edição 0013 ficou pessoal então largarei alguns fatos curiosos sobre meu passado profissional e algumas trívias que nem parentes mais próximos conhecem.
Forte, estatura heróide, pálido de argila, barba inteira, rente, pontiaguda, vestindo corretamente, parecia à primeira vista uma dessas nulidades elegantes, a que a natureza, satisfeita por masculinizar-lhes o aspecto heróico, regateia lugar no espaço. Bastava porém, reparar na flexão das suas sombrancelhas espessas, na expressão imperativa do seu olhar, para descobrir dentro dessa míngua orgânica, um caráter em carne viva. R.Spegel, circunspecto vivencial, galanteador barato por conveniência física e peripatética e só. Inteligência e sagacidade, para quê! Bruto.
Giancarlo V., 1922: in, Recheaux d’aveux
Sou um sujeito extrememente envolvido com o jetset nacional e estrangeiro. Já tomei uns goles fortes com Toquinho e Vinícius (vede episódio narrado pelo biógrafo Becker na edição de aniversário d’O CRUZEIRO” de 1977), já hospedei José Saramago em minha casa de campo em Bilbao, já dei carona a Pedro Juan Gutiérrez de Vladivostok a Saigon em plena Guerra das Seis Horas (Epísódio Bélico de 1983 na Guerra Fria, completamente abafado pela imprensa). Enfim, sou habituado a conviver com personalidades de evidência.
Aprendi meu escorreito conversar e excelente português com Nat King Cole, durante aquela famosa turnê pelo México em 1958;
Casei-me três vezes com a mesma mulher, tendo-mo desquitado duas vezes até o presente momento;
Lutei na batalha de Guadalcanal como primeiro-tenente no mesmo pelotão de James Jones (o escritor), de quem quase arranquei dois dedos à faca por roubar três cigarros camel do meu embornal;
Sou faixa rajada em kung-fu Shaolin do Norte (técnica da serpente);
Depus a favor de Arthur C. Clarke no Sri Lanka, quando o ultimo foi acusado de pedofilia;
Pisei descalço e com a sola do pé enfarinhada de areia e de um pó branco esquisito na boca de Mick Jagger durante a famosa briga do Amnesia ocorrida na despedida dos Planells na ilha de Ibiza (Espanha), 1971
Desde então nossa amizade desgastou;
Sou autor das expressões “formar-se na escola da vida” e “o mar não está para peixe”, entre outras;
Escrevi roteiros televisivos para a Excelsior nos anos 60; era conhecido como o sempiterno canalha do ‘cinema nacional’.
Tenho fobia de aranhas PCD com seis ou sete pernas.
Estive no Brasil ainda este mês de Maio.
Viajar era um barato para mim: o planejamento, as listas, as compras, os pedidos afobados de última hora, os reencontros com os amigões.
Eu não me preocupo mais com o país, com as diferenças e com a corrida paralela. Isso tudo é uma novela destrambelhada rodando de forma suicida em uma ladeira irregular e sem pretensão alguma de parar. O quanto mais tento racionalizar minhas políticas emocionais, mais eu entro em um conflito dicotômico frustrante. Sou um apólida por autopreservação.
A cada viagem de retorno para o Brasil eu apago um carimbo consular a mais para qualquer outro lugar do mundo.
Eu tenho – sei lá – talvez uns 50 anos restantes, no máximo. A vida é assim, há de se estipular. Pense aí. Sou proletário, socialista, assalariado, comprovante de renda, parcelador, a massa de manobra, o cara que não têm investimentos nem consegue se manter de rendas pelo resto da vida se quisesse se aposentar aos 40. Isso é sabido e então tenho, até os 66 anos de idade, que é o meu prazo de aposentadoria no país que resido, para viajar e usar meu minguado mês de férias. Eu posso viajar uma vez por ano para um lugar longe, porque isso demanda dinheiro. São no máximo 27 grandes viagens, vinte e sete novos países para viajar. Depois dos 66 talvez eu viaje mais, talvez eu seja como todos os de sessenta e seis que adquirem medo do novo e me plante seguramente e estavelmente em casa.
Entende o conflito?
Toda viagem para o Brasil será uma viagem social. Sem férias, sem o gosto bom de entrar em uma rua desconhecida de um país que você não sabe falar uma frase inteira sem errar tudo. Quase uma obrigação de arrastar as chinelas no tapetão de pentecostes.
Viajar para o Brasil não é ruim, não me entenda mal.
Ruim é perceber o país em uma timelapse pessoal incrível. Eu vejo o salto de novidade a cada ano, e tudo muda rápido demais. Perdi a conexão do negócio. Algumas coisas pioram e ninguém percebe porque é a fábula do sapo na panela de água esquentando no fogão e ele morreu. Eu quero ver gente nova. Eu quero ver país diferente, ser enganado pelo vendedor de bengo de Marraquéche, negociar uma refeição ordinária no Butão. Andar de tuktuk na India, ter uma disenteria apimentada por lá.
Mas vá lá, parei de ser resmungão e estive no Brasil ainda este mês de Maio.
A diferença agora é que a maioria do tempo útil brasileiro foi a trabalho remoto pela firma, de maneira legítima. O que foi bom porque no final das contas quando viajava de férias muitos dos meus estavam trabalhando e emparelhei as aparas.
Nada melhor que todo mundo então trabalhar durante o horário cristão e raparigar nos horários trevosos.
Essa viagem foi uma grande tentativa de restaurar a paz que não habita em mim. Deu muito certo não. Deixei de procurar todos meus amigos. Marquei um revival com os chapas da faculdade. Não vi gente alguma a não ser uns parentes e mesmo assim sem forçar. Estava na cidade e andava pelos cantos igual caixeiro devedor.
Juro que na próxima me esforçarei melhor para ser mais sociável.